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COMBATE AO FASCISMO – “A universidade é uma força de transformação social”, diz Vladimir Safatle em debate da ADUFC

Vladimir Safatle (USP) veio a Fortaleza para ciclo de debates e lançamento do livro “Em um com o impulso” (Fotos: Nah Jereissati/ADUFC-Sindicato)

O Auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará (UFC) foi palco, na noite da última quinta-feira (9), de uma profunda análise sobre a democracia no Brasil. Centenas de pessoas foram à universidade acompanhar a abertura do ciclo de debates promovido pela ADUFC, com palestras dos professores e filósofos Vladimir Safatle (USP) e Custódio Almeida (UFC). Foi instalado um telão do lado de fora da sala para que todas e todos conseguissem assistir à conferência, que extrapolou a lotação do auditório. O debate foi atravessado por falas contundentes sobre o papel da universidade e dos/as intelectuais no enfrentamento ao fascismo. “A universidade, mesmo com suas dificuldades, é uma força de transformação social e precisa se assumir como tal. E ainda mais agora que ela mudou sua estrutura e já não é mais uma universidade de elite”, defendeu Safatle.

O filósofo acredita que os intelectuais não deve recuar. “Somos intelectuais com muito orgulho. Sabemos que o exercício crítico exige rigor, um profundo engajamento, que muitas vezes vai contra nossos próprios interesses e certezas”, disse, lembrando do movimento de perseguição sistemática da extrema direita bolsonarista contra a pesquisa e a academia. “Eles sabem que a gente tem alguma força e capacidade de mobilizar, por isso os governos de extrema direita sempre começam a tentar bloquear escolas e universidades”, acrescentou Vladimir Safatle, que lança o livro “Em um com o impulso” nesta sexta-feira (10), às 18h30, na sede da ADUFC em Fortaleza. O livro é o primeiro volume da trilogia “Experiência estética e emancipação social”.

Também filófoso, o Prof. Custódio Almeida lembrou do compromisso histórico da universidade com a democracia. “A universidade é uma instituição que reclama democracia, clama por democracia, por liberdade de pensamento. E a gente não deve fazer isso em voz baixa”, ressaltou. “Nós precisamos dialogar com a história com a capacidade da escuta muito alta. Não sabe o que é diálogo quem não é capaz de escutar”, complementou o docente, que, apesar de liderar a lista tríplice e ter sido escolhido pela comunidade universitária na última consulta para reitor, não foi nomeado reitor por Jair Bolsonaro, que optou por impor um interventor – o postulante com menos votos na disputa.

Para Custódio, a recomposição da democracia na universidade exige uma participação ativa e permanente de sua comunidade. “Entendo que a nossa universidade neste momento pede a participação de todos nós tanto para fazer essa autocrítica como defender a democracia. Nós queremos uma UFC viva e democrática, que seja capaz de incluir sempre, uma UFC que institucionalmente combata a exclusão. Isso é efetivamente defender a democracia e combater o fascismo”, opinou. 

O evento foi especialmente simbólico para a comunidade da UFC porque marca a reocupação do espaço por movimentos sindicais e docentes, após três anos e meio de perseguição de um interventor bolsonarista. “Não poderia começar essa noite sem lembrar que essa é a primeira vez que voltamos à reitoria da Universidade Federal do Ceará nos últimos anos. E nós sabemos que esse retorno não é uma concessão, é uma conquista. E que não significa anistia ou esquecimento do que nós passamos nos últimos quatro anos de intervenção na UFC, porque esse lugar é nosso”, destacou a mediadora do debate e secretária-geral da ADUFC, Profª. Helena Martins, arrancando aplausos demorados da plateia. A Diretoria do sindicato também foi representada na mesa pelas professoras Irenísia Oliveira (vice-presidente) e Lena Espíndola (diretora de Assuntos de Aposentados). O presidente da ADUFC, Prof. Bruno Rocha, que estava em Rio Branco (AC) participando do 41º Congresso do ANDES-SN, saudou os convidados por vídeo.

Fascismo está enraizado na história política do Brasil e precisa ser enfrentado

O filósofo Vladimir Safatle contextualizou o enraizamento histórico do pensamento fascista no Brasil e sua profunda interdependência com o colonialismo. Segundo o docente, o Brasil tem como uma de suas tendências constituintes o fascismo nacional. “Nós fomos criados em meio a uma ilusão, a ilusão de que se nós fizéssemos uma conciliação tranquila, um pacto amplo, se aceitássemos em última instância uma negociação contínua, se naturalizássemos uma transição infinita para nunca se realizar efetivamente, então nós conseguiríamos evitar o pior, evitar as contradições e os conflitos. Nada disso aconteceu, nossa análise estava completamente equivocada”, analisou.

A fala do pesquisador passeou por diferentes momentos históricos do país: da adesão massiva e popular ao integralismo nos anos 1930 à condescendência do pós-ditadura civil-militar com torturadores pagos pelo próprio Estado, através de uma anistia controversa. “O Brasil entrou pra história global por nunca ter colocado nenhum torturador na cadeia nem rever a anistia fascesca”, criticou. Sobre as manifestações fascistas mais recentes, já no governo de Jair Bolsonaro, acrescentou: “pela primeira vez na história da República brasileira, um presidente assinou uma carta à nação com o lema integralista Deus, Pátria e Liberdade”.

Para Vladimir Safatle, essa conexão com o fascismo é fortemente ancorada por um passado colonial. “O latifúndio escravagista exportador faz uma distinção ontológica entre sujeitos, de um lado aqueles reconhecidos como pessoas e que têm direito a um Estado protetor; do outro, sujeitos que caem ao estado de coisas e, para eles, não têm Estado protetor, só predador. Quando essas pessoas morrem, não tem dor, nem luto, nem lágrimas. Não tem história, nem nome, nem nada”, avaliou, descrevendo o Brasil como “o maior experimento necro-político mundial”. “Esse é o modelo do Estado brasileiro: gerir uma guerra civil não declarada, gerir massacres administrativos e chacinas periódicas”, pontuou.

O ciclo de debates da ADUFC segue até abril, com palestras abordando diferentes temas. A segunda conferência será no dia 15/2, às 18h30, na sede do Sindicato em Fortaleza, sobre a temática “O papel da educação e dos trabalhadores na luta pela democracia”. O expositor é o Prof. Antônio Cruz, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), e a mesa de debate será composta pela Profª. Zuleide Queiroz, da Universidade Regional do Cariri (URCA) e 2ª vice-presidenta do ANDES-SN; e pelo Prof. Nilson Cardoso, presidente da diretoria eleita do Sindicato de Docentes da Universidade Estadual do Ceará (Sinduece). A diretora de Assuntos de Aposentados da ADUFC, Profª. Lena Espíndola, mediará a conversa.

[+] Assista ao debate na íntegra no canal da ADUFC no YouTube:

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