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A Previdência Social e a Crise

*Enio Pontes

Não é de hoje que os nossos governantes de plantão elegem a Previdência Social como uma das principais vilãs do desarranjo das contas públicas. Na verdade, a história recente do país tem registrado ciclicamente diversas crises econômicas, cujas causas possuem, em última análise, características semelhantes. Na maioria das vezes o descontrole inflacionário, a falta de um gerenciamento eficiente das contas públicas e o desarranjo fiscal levaram o país a amargar dias difíceis. O chamado “déficit previdenciário” sempre foi um argumento muito mais político do que técnico para justificar a incompetência da gestão pública.

Entre 1968 e 1973, época em que os militares estavam no poder, o Brasil experimentou o que se denominou de “Milagre Brasileiro”. Um forte processo de industrialização que impulsionou o crescimento da economia brasileira levando o Produto Interno Bruto (PIB) a crescer em torno de 10% ao ano. Esse bom resultado incentivou o governo militar a buscar financiamento externo (EUA) para incrementar ainda mais a escalada de crescimento da economia brasileira.

Todavia, em 1979, os EUA promoveram uma elevação brutal das taxas de juros, o que acarretou reflexos negativos à nossa economia, como a explosão da inflação e o aumento assustador da Dívida Pública. Mas, mesmo com esse quadro de estagnação econômica, foi nesse período, entre 1960 e 1974, que a Previdência Social ganhou força e começou a consolidar-se. Em 1960 nasceu a Lei Orgânica da Previdência Social.

Nessa época a Previdência Social já contemplava todos os trabalhadores urbanos. Os trabalhadores rurais viriam a ser alcançados em 1963, ano da criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), atualmente (INSS). Em 1974 foi criado o Ministério da Previdência Social. Naquele momento não foi possível colocar na conta da Previdência a crise do período.

É fundamental destacar que a Previdência Social não foi uma criação isolada e sem previsão de fontes de financiamento. O Sistema de Seguridade Social, integrado pela Previdência Social, pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pela Assistência Social, possui fontes de financiamento definidos em lei, grande parte oriundas de receitas vinculadas, das contribuições dos empregados e empregadores, dos trabalhadores autônomos e de parcelas do Confins e do Pis/Pasep.

Vários especialistas e professores universitários desmentem os números do déficit apresentados pelo atual governo. Enquanto a administração Temer insiste num déficit de R$ 136 bilhões, os especialistas afirmam que há um superávit da ordem de R$ 24 bilhões. A divergência dos números está principalmente na base de cálculos utilizados. O objetivo desse artigo, no entanto, não é entrar no detalhe dos cálculos.

O importante é mostrar que a Previdência Social está sendo utilizada mais uma vez para justificar uma situação de crise, quando, na verdade, a intenção é criar uma cortina de fumaça e obter as condições necessárias para fazer modificações perversas no atual modelo previdenciário. A proposta do governo prevê direito a 76% da base de cálculo do benefício com 25 anos de contribuição. Essa taxa aumenta em 1% a cada ano a mais de trabalho. Significa dizer que, para chegar a 100%, ou seja, ao benefício integral, será necessário somar 49 anos de contribuição.

Enquanto isso, alguns setores produtivos foram beneficiados com isenção previdenciária. O agronegócio voltado para a exportação, por exemplo, é isento de qualquer contribuição para a Previdência Social, e que, em 2015, recebeu subsídio de R$ 9 bilhões do INSS. Fica mais uma vez provado que, a Previdência Social está servindo apenas como discurso político para tentar aprovar medidas absolutamente duras contra os trabalhadores e a classe média. No Brasil a máxima de socializar os prejuízos e privatizar os lucros nunca foi tão atual.

*Enio Pontes é professor da Universidade Federal do Ceará UFC e coordenador estadual do Comitê da Dívida Cidadã.

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