Docentes das três universidades federais cearenses (UFC, UFCA e UNILAB) aprovaram, em Assembleia Geral na última quarta-feira (20), com presença de 244 professores, o indicativo de greve, ainda no primeiro semestre de 2024, para a construção de uma greve unificada da Educação e do funcionalismo público federal. A votação ocorreu nos jardins da reitoria da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, com transmissão virtual para os campi do interior. Entre os encaminhamentos, estão a formação de comitês de mobilização nas universidades e a realização de plebiscito. Na sexta-feira (22), a ADUFC participa, em Brasília, juntamente com seções sindicais de outros estados, da reunião do Setor das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) do Sindicato Nacional, o ANDES-SN, onde a pauta será deliberada.
A ADUFC já manifestou apoio à paralisação dos/as servidores/as técnicos/as administrativos/as (TAEs) da UFC, UFCA e UNILAB, deliberada em 11 de março. A assembleia docente foi realizada no mesmo local onde está instalado o comando de greve dos TAEs e recebeu a presença e o apoio de entidades representando servidores técnicos e estudantes. A construção da greve geral da Educação e do funcionalismo público federal está inserida no contexto da campanha salarial dos servidores federais e do reajuste zero em 2024. O Conselho de Representantes da ADUFC, reunido na última quinta-feira (14), já havia recomendado a aprovação da construção da greve à Assembleia Geral.
A decisão de greve não é repentina: ela ocorre após oito meses de reuniões, sem quaisquer avanços, da Mesa Nacional de Negociação Permanente, da qual participaram interlocutores do governo federal, por meio do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, e entidades sindicais. “Não encontramos outra forma de dizer cabalmente ao governo Lula que não aceitaremos reajuste zero e perdas salariais inflacionárias em um governo que nós votamos e defendemos contra o fascismo”, ressaltou a presidenta da ADUFC, Profª. Irenísia Oliveira. “Não é penalizando o trabalhador que conseguiremos avançar na construção de uma sociedade mais justa e igualitária para todos”, acrescentou. Em sua fala, a dirigente fez uma contextualização da campanha salarial dos servidores federais e dos debates com o governo desde o ano passado.
Vários/as docentes fizeram falas antes da votação e expuseram os motivos de dar seguimento à mobilização da categoria. “Conseguimos discutir a expansão das universidades, mas não a precarização, os ar-condicionados que não funcionam… A gente precisa melhorar a nossa condição de vida e, para isso, temos que mobilizar e fazer greve. Espero que seja uma luta bonita, rápida e necessária”, destacou o Prof. Ivânio Azevedo, do Curso de Filosofia (ICA/UFC). A Profª. Ana Paula Rabelo, docente da UNILAB, citou a “política de desvalorização do ensino superior”, materializada a partir da desvalorização dos/as trabalhadores/as da Educação e do desmonte orçamentário das universidades.
Já o Prof. Tiago Coutinho, da Universidade Federal do Cariri, resgatou a declaração do presidente Lula, no início do atual mandato, em que ele convocou movimentos sociais e sindicais a cobrarem o governo e apontarem eventuais erros. “Nós queremos que esse governo dê certo e valorize essa pauta do serviço público. Se a gente não conseguir reajuste agora, está encerrando a chance de ter reajuste. A greve é necessária para dizer que, para um governo dar certo, é preciso que se pense no serviço público”, ressaltou.
A coordenadora de Administração e Finanças do Sindicato dos Trabalhadores das Universidades Federais no Estado do Ceará, Cássia Araújo, manifestou a solidariedade dos servidores técnicos à mobilização docente. “As pessoas estão dispostas a continuar na greve mesmo com os boatos de corte de ponto (referindo-se à Instrução Normativa 54, editada durante o governo Bolsonaro e ratificada pela atual gestão federal). Juntos somos fortes e não vai ter governo que nos pare”, reforçou.
Integrantes do movimento estudantil também ofereceram apoio à categoria docente e afirmaram que irão se engajar na construção de uma greve geral da Educação. “A UNE vem prestar solidariedade à mobilização. Construir uma universidade pública, gratuita e de qualidade perpassa tratar bem os seus profissionais. A universidade com a nossa cara é uma universidade que valoriza os professores”, destacou Gabriel de Oliveira, representando a União Nacional dos Estudantes. O Diretório Central dos Estudantes da UFC também esteve presente na AG. “Estamos aqui para declarar apoio aos docentes, assim como fizemos com os TAEs, porque entendemos que essa é a única maneira de transformar a nossa universidade. Declaramos apoio à mobilização e nos somaremos às atividades dos docentes e dos TAEs”, disse Dandahra Cavalcante (DCE/UFC).
A pauta vem à tona seguindo as deliberações do 42º Congresso do ANDES-SN, que decidiu, em 28 de fevereiro, pela construção de uma greve do Sindicato Nacional diante da frustração com mais uma rodada de negociação com o Palácio do Planalto, sem sucesso, ocorrida no mesmo dia. A edição do evento deste ano ocorreu em Fortaleza, sediado pela ADUFC no Campus do Pici da UFC, e reuniu mais de 600 professores/as de 86 sindicatos de todo o país.
Entenda a proposta reivindicada pela categoria docente
A reunião de 28 de fevereiro foi a primeira rodada da mesa de negociação do ano, sendo concluída sem avanços sobre a recomposição salarial de servidores e demais demandas apresentadas na contraproposta protocolada pela bancada sindical. O documento prevê a recomposição das perdas salariais do período referente ao governo Temer até o final do governo Lula. O índice reivindicado para o bloco de servidores/as que reúne docentes federais é de 22,71%, dividido em 3 parcelas de 7,06% em 2024, 2025 e 2026. O cálculo considera as estimativas de inflação, conforme projeção do Banco Central. O governo federal, por sua vez, manteve a proposta apresentada no fim do ano passado de 9%, em duas parcelas de 4,5%, mas com a primeira a ser paga apenas em maio de 2025 e a outra metade em 2026, gerando revolta nas categorias.
Além disso, as entidades sindicais reivindicam equiparação dos benefícios para os servidores dos três poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo) sem exclusão das pessoas aposentadas, revogação das medidas que atacam servidoras/es e a assinatura de um termo de compromisso para negociação das perdas salariais do governo Dilma.
Relembre as negociações dos servidores federais com o governo:
- Fevereiro/2023 – Governo instala Mesa Nacional de Negociação Permanente, que se manteve fechada nas gestões Temer e Bolsonaro
- Maio/2023 – Primeira reunião da mesa de negociação, que deflagrou o debate sobre a metodologia de trabalho
- Maio/2023 – Início do pagamento do reajuste de 9% aplicado em 2023 – se levado em conta o ano inteiro (jan/dez), a média geral ficou em 6%, suficiente apenas para repor a inflação do último período
- Julho/2023 – Entidades sindicais protocolam a pauta de reivindicações da campanha salarial de 2024, com pedido de reajuste unificado de 39,92% (parcelado em três vezes) para docentes federais com base nas perdas salariais desde 2010
- Dezembro/2023 – Após meses de negociações, o governo apresentou a primeira proposta de reajuste: zero por cento em 2024 e 9% dividido em 2025 e 2026. Também ofereceu o reajuste do Auxílio Alimentação, mas esse benefício exclui servidores aposentados
- Janeiro/2024 – Servidores apresentam contraproposta de 22,71%, dividido em 3 parcelas de 7,06% em 2024, 2025 e 2026
- Fevereiro/2024 – Governo reafirma o reajuste zero da proposta de dezembro/2023
- Março 2024 – Servidores técnicos da UFC, UFCA e UNILAB deflagram greve, e docentes aprovam indicativo de greve, com data a ser definida